'Eu só andava de cabeça baixa, hoje não', diz mulher vítima de agressão

'Apolônias do Bem' devolve sorriso e autoestima às mulheres violentadas.
ONG faz exposição de fotos e lança documentários sobre projeto em Poços.





Quem está participando da 11ª edição do "Sorriso do Bem", evento que reúne mais de 500 dentistas voluntários da ONG "Turma do Bem" em Poços de Caldas (MG), até a próxima sexta-feira (4), talvez nem imagine o quanto a vida de algumas mulheres foi transformada com o projeto "Apolônias do Bem", iniciativa da ONG. Exposição na cidade, mostra fotos de antes e depois destas mulheres.

O projeto vem mudando a vida de mulheres que vivenciaram situações de violência doméstica ao oferecer tratamentos odontológicos completos e gratuitos. Muitas destas mulheres foram vítimas de agressões dos maridos, companheiros e até de familiares. Em consequência da violência, além do trauma, muitas perderam praticamente todos os dentes e até a vontade de sorrir.
Com dentes recuperados, Regiane diz que agora não para de sorrir. (Foto: Lúcia Ribeiro/G1)Com dentes recuperados, Regiane diz que agora
não para de sorrir. (Foto: Lúcia Ribeiro/G1)


É o caso de Regiane Mota de Oliveira, de 41 anos, uma das primeiras beneficiárias e que hoje trabalha na ONG. Sentada no banco da praça em Poços de Caldas ela contou sobre a experiência que transformou a vida dela e das três filhas.

"Eu conheci o 'Apolônias do Bem' em 2012, fui uma das primeiras beneficiárias. Hoje, O primeiro sorriso que eles encontram lá na ONG é o meu, porque eu que recepciono quem entra e, recebo todas as pessoas muito bem, gosto muito do que eu faço lá. Ah, e eu estou sempre com o meu melhor sorriso. Eu posso dizer que há 4 anos a minha vida mudou completamente", contou Regiane.

Antes de ganhar um novo sorriso, ela foi vítima de v[árias agressões e violências que lhe custaram os dentes, a autoestima e a alegria em viver.

"A 'Turma do Bem' é muito especial, eles me ajudaram muito e com muita coisa, principalmente com o meu sorriso e com a minha autoestima. Eu só andava de cabeça baixa, hoje não. Cabeça baixa hoje, só se for pra pegar alguma coisa no chão, fora isso, sou só sorrisos. Sem contar que eu emagreci quase 30 Kg depois que recuperei meu sorriso, porque com os dentes eu consegui voltar a mastigar e fiquei até mais saudável", concluiu Regiane, com um imenso sorriso.

Vida nova
Com o novo sorriso, elas recuperam a autoestima, ganham confiança, reatam laços e voltam a sonhar. Voltam ao mercado de trabalho e ganham coragem para dar início a uma nova vida.

"Saúde, esperança, vida nova. Como se fosse uma mulher inteira. Hoje eu consigo olhar no espelho e ver a minha imagem, porque antigamente eu não fazia nem questão de ver. Eu sabia que eu existia, mas eu era só um corpo, faltava alguma coisa. Mas, a partir de agora é correr atrás", contou a beneficiária atendida no Rio de Janeiro, Tânia Isabel Pinto Fontes, de 50 anos.
ANTES E DEPOIS - Tânia Isabel Pinto Fontes, de 50 anos, beneficiária do Rio de Janeiro. (Foto: Divulgação/Turma do Bem - Apolônias do Bem)ANTES E DEPOIS - Tânia Isabel Pinto Fontes, de 50 anos, beneficiária do Rio de Janeiro. (Foto: Divulgação/Turma do Bem - Apolônias do Bem)


A cuidadora de idosos, que atualmente busca recolocação no mercado de trabalho, ainda não acredita que voltou a se olhar no espelho. Segundo ela, desde que voltou a sorrir tudo ainda está um pouco confuso.

"A ficha ainda não caiu, está uma confusão. Um tiroteio de sentimento dentro de mim. Voltar a sorrir e a viver com esperança é como se eu estivesse sido presa por algum delito e, ainda não sei estou em regime semi-aberto ou me colocaram na calçada, porque quando eu ganhei a liberdade, neste caso entenda, meus dentes, eu não sei o que fazer com essa minha liberdade", finalizou Tânia com um sorriso.
Tânia durante evento em Poços de Caldas (MG). (Foto: Lúcia Ribeiro/G1)Tânia durante evento em Poços de Caldas (MG).
(Foto: Lúcia Ribeiro/G1)


Novidade em 2016
A novidade é que desde o início deste ano, além das mulheres, as transexuais vítimas de agressões também foram incluídas no projeto. Um destes casos é o de Jonathan Alderson de Castro Bucão, de 31 anos, ou Daniela de Castro, como prefere ser chamada.

A estudante que nasceu em Manaus, e mora em São Paulo há pouco menos de 2 anos, passou pela cirurgia de reconstrução do sorriso em maio. Hoje, ela já tem planos para o futuro.

"O que eu penso na verdade é um futuro maravilhoso. Uma oportunidade de empregabilidade, pois eu vim lá de Manaus, do Norte do Brasil, e com essa intenção de ter um futuro para que eu possa ter uma vida confortável e com meu sorriso de volta, tudo muda. Há esperança para coisas boas", disse a transexual.

Além disso, durante o evento "Sorriso do Bem" em Poços de Caldas, acontece o lançamento de sete documentários gravados com algumas das beneficiárias atendidas pelo "Apolônias do Bem".
A transexual Daniela de Castro é uma das beneficiárias do projeto. (Foto: Divulgação/Turma do Bem - Apolônias do Bem)ANTES E DEPOIS - Transexual Daniela de Castro é uma das beneficiárias do projeto. (Foto: Divulgação/Turma do Bem - Apolônias do Bem)


Apolônias
A ideia do nome do projeto surgiu de uma outra mulher, a Apolônia. Uma personagem histórica que viveu em Alexandria, no Egito, que foi torturada e teve todos os seus dentes arrancados ou quebrados. Por esta razão, é popularmente conhecida como a padroeira dos dentistas.

Desde a criação em 2012, o projeto já atendeu mais de 600 mulheres. O resultado foi imediato e a Organização das Nações Unidas (ONU) passou a apoiar institucionalmente o projeto, que também faz parte do UNA-SE pelo fim da violência contra as mulheres, campanha do secretário Ban Ki-moon, da ONU.

Para ser uma beneficiária do projeto, as mulheres precisam passar por triagens realizadas pelas equipes da "Turma do Bem" em casas de apoio às mulheres vítimas de violência. Além disso, as interessadas também podem enviar uma mensagem para o e-mail apoloniasdobem@tdb.org.br, que deve conter o Boletim de Ocorrência (B.O.) da agressão, depois disso, uma conversa via Skype ou pessoalmente será agendada antes de dar sequência para o encaminhamento clínico.
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Desde o início deste ano, transexuais vítimas de agressões também foram incluídas no projeto. (Foto: Lúcia Ribeiro/G1)Desde o início deste ano, transexuais vítimas de agressões também foram incluídas no projeto. (Foto: Lúcia Ribeiro/G1)
 Fonte G1 Sul de Minas