Projeto polêmico autoriza o município a absorver alunos dos anos iniciais, que hoje estão na rede estadual de ensino.
Em meio a polêmicas, a Câmara Municipal de São Sebastião do Paraíso, no Sul de Minas, interrompeu o recesso parlamentar nesta segunda-feira (6/7) para votar e aprovar, em sessão extraordinária, projeto de lei de autoria do prefeito Marcelo Morais que autoriza o Executivo a celebrar convênio com a Secretaria de Educação de Minas Gerais para a absorção dos alunos dos anos iniciais (1º ao 5° anos), que estão na rede estadual de educação, e a municipalização da Escola Estadual São José.
O projeto foi discutido em audiência pública e em diversas reuniões com equipes do Executivo Municipal, Secretaria da Educação e Superintendência Regional de Ensino.
O texto normativo foi aprovado por unanimidade e em votação única. Foram oito votos favoráveis. O vereador Sérgio Gomes não compareceu e José Luiz das Graças ainda se recupera em casa da COVID-19. Marcos Vitorino retornou à Casa após se recuperar da doença.
No convênio De Mãos Dadas, do governo do Estado, foi acordado que a rede municipal receberá R$ 8 milhões para a compra de bens, material e execução de obras para a rede municipal de educação.
Com esse valor, a prefeitura pretende construir duas novas escolas (atendendo 400 alunos cada) e duas novas creches (150 alunos em cada), nas regiões dos bairros Belvedere e Diamantina, com previsão de entrega em julho de 2022. A matéria segue para sanção do Prefeito Municipal, Marcelo Morais.
Os recursos financeiros que eram destinados ao governo estadual para custeio dos alunos também serão repassados ao governo municipal - com a mudança, o município receberá um aporte adicional de R$ 6 milhões para a educação por ano.
Em contrapartida, o município ficará responsável pelos anos iniciais do ensino fundamental (1º ao 5º ano) das escolas estaduais Comendador João Alves de Figueiredo, São João da Escócia, Comendadora Ana Cândida de Figueiredo, Clóvis Salgado, Coronel José Cândido, Professora Inês Miranda Almeida e São José. A estrutura física e bens materiais da E.E. São José serão transferidos ao Município, tornando-se E.M. São José. Atualmente, a Superintendência Regional de Ensino atende 982 alunos, 46 turmas, nos anos iniciais do Ensino Fundamental.
Audiência pública
A prefeitura entregou o projeto de lei à Câmara de Paraíso em 21 de junho deste ano. A iniciativa, entretanto, não é unanimidade e divide opiniões, fato que ficou evidenciado na audiência pública de sexta-feira (3/7).
O secretário municipal de Educação, Lucas Cândido, ressaltou que já era planejado pela administração a construção das novas unidades escolares. No entanto, o convênio dá a oportunidade de acelerar os planos.
"Vamos atender um número grande de alunos para a educação infantil. Um número maior de prédios automaticamente gera número maior de turmas. Hoje, por falta de espaço físico, temos que atender os alunos em tempo parcial, principalmente a pré-escola. A partir do momento que tivermos quatro novos prédios, teremos mais espaço e poderemos atender número maior de crianças em regime integral, possibilitando aos pais trabalharem."
O vice-prefeito Daniel Tales reforçou: "Temos visto dificuldade para conseguir vaga em creches. A construção desses prédios trará dignidade para as famílias, tendo creches para deixar seus filhos em segurança. Eles não terão mais que atravessar rodovia debaixo de sol e chuva".
Sucateamento e desemprego
Manifestaram-se contrários à proposta os representantes do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE/MG), Márcio Roberto Freitas e Lilian Gonçalves.
Márcio argumentou que o momento de pandemia não é certo para a discussão e implementação do projeto. Afirmou que a rede estadual de ensino está sucateada e que os professores designados (que não são servidores efetivos) ficarão desempregados, assim como profissionais da secretaria, merendeiras e auxiliares de limpeza.
Disse ainda que o projeto Mãos Dadas não foi discutido nas escolas. "A municipalização não é obrigatória, temos várias cidades em que o prefeito recusou o projeto."
Lilian citou o exemplo negativo do município de Capitólio, no qual, segundo ela, a municipalização não funcionou e foi revertida. "Hoje, Capitólio é excelência na educação de 0 a 3 anos, porque focaram bem na obrigação para a rede municipal."
Afirmou também que o projeto deveria ser discutido na comunidade escolar primeiro, para depois chegar à Câmara Municipal. Ressaltou ainda que o Estado não cumpre o investimento mínimo na educação (25%), e que o município hoje não consegue atender à educação infantil.
Por fim, Lílian Gonçalves questionou o motivo de a proposta estar sendo debatida em âmbito municipal, se ainda não foi aprovada pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
Representando o Sindicato dos Servidores Públicos de São Sebastião do Paraíso (Sempre), Regina Célia Nunes levantou uma série de pendências na rede municipal de educação, como o plano de carreira do magistério e o cumprimento do piso salarial nacional. "A universalização do ensino e a construção de escolas são necessárias sim, mas há muito a ser considerado antes disso."
'Experiências positivas'
O presidente do Conselho Municipal de Educação, Cícero Barbosa, defendeu a adesão ao projeto De Mãos Dadas. Ele citou as experiências que considera positivas de municipalização das escolas Campos do Amaral e Interventor Noraldino Lima, na década de 1990.
"Vai atender aos anseios da comunidade. Quando essa estrutura for criada, vai abrir possibilidade de a rede estadual executar um programa de educação integral com os alunos do 6º ao 9º ano, que já reduziria a possibilidade de desemprego, teria possibilidade de contratação dos professores designados."
Segundo ele, um ponto de preocupação é a municipalização das escolas São João da Escócia e Comendadora Ana Cândida de Figueiredo, por uma questão de territorialidade.
"Ficaria muito longe pegar alunos que hoje estão no Muschioni e levá-los para outra escola, ainda que fosse a José Carlos Maldi. Uma proposta seria a municipalização total da E.E Comendador João Alves de Figueiredo, e deixar Ana Cândida e Escócia com o estado. Se municipalizar a João Alves, você fica com uma escola municipal numa região que sabemos que tem três loteamentos para sair."
Ele ainda defendeu maior clareza na garantia dos direitos dos trabalhadores.