A enfermeira Didi, a técnica de enfermagem Sandra e a psicóloga Palowa falam dos maiores desafios nesse um ano de pandemia
“Covid, covid, covid!”, grita a enfermeira Adileia Pereira de Jesus, a Didi, de 52 anos, quando o neto de 7 anos corre para abraçar a vó que chega de mais um plantão no Hospital Eduardo de Menezes, em Belo Horizonte. O menino sente saudade do hábito carinhoso que tinha antes da pandemia da covid-19, quando os abraços não representavam um risco à saúde pública.
Didi é uma das milhares de mulheres que atuam na linha de frente do combate à pandemia em Minas Gerais e que devem, mais do que nunca, ser homenageadas neste Dia Internacional das Mulheres, celebrado em 8 de março.
Para a enfermeira, repreender o neto é tão difícil quanto as 9 horas diárias que passa cuidando dos 30 pacientes internados atualmente no CTI do HEM. Por lá, ela já atendeu famílias inteiras com a doença e coleciona casos difíceis em pouco mais de um ano de pandemia.
“Tinha uma senhora que falava ‘eu tenho que ficar boa, porque meu marido também está doente, eu deixei ele na UPA’. E a gente sabia que ele já tinha falecido”, conta, sem conseguir segurar o choro.
“Covid, covid, covid!”, grita a enfermeira Adileia Pereira de Jesus, a Didi, de 52 anos, quando o neto de 7 anos corre para abraçar a vó que chega de mais um plantão no Hospital Eduardo de Menezes, em Belo Horizonte. O menino sente saudade do hábito carinhoso que tinha antes da pandemia da covid-19, quando os abraços não representavam um risco à saúde pública.
Didi é uma das milhares de mulheres que atuam na linha de frente do combate à pandemia em Minas Gerais e que devem, mais do que nunca, ser homenageadas neste Dia Internacional das Mulheres, celebrado em 8 de março.
Para a enfermeira, repreender o neto é tão difícil quanto as 9 horas diárias que passa cuidando dos 30 pacientes internados atualmente no CTI do HEM. Por lá, ela já atendeu famílias inteiras com a doença e coleciona casos difíceis em pouco mais de um ano de pandemia.
“Tinha uma senhora que falava ‘eu tenho que ficar boa, porque meu marido também está doente, eu deixei ele na UPA’. E a gente sabia que ele já tinha falecido”, conta, sem conseguir segurar o choro.
Emoção
Com quase 30 anos de atuação como enfermeira, Didi também viveu, nos últimos 12 meses, o fato mais marcante na profissão: a família de uma de suas pacientes que estava internada e não resistiu foi para cima do viaduto esperar a funerária passar com o corpo. Como os velórios estavam proibidos para preservar a saúde da população, eles pediram para o carro parar, para que eles pudessem dar adeus de longe.
“Até hoje, quando eu conto isso, dói. Já pensou ter uma pessoa da sua família doente e você não poder ter contato? Não poder ver a última vez, se despedir? Isso mexe muito com a gente, porque poderia ser a minha família também”, diz.
Na casa da Didi, o novo normal ganhou tons de esperança quando ela recebeu as duas doses da vacina, em janeiro, se tornando a primeira enfermeira mineira a ser imunizada.
“A pandemia afetou a nossa vida pessoal, antes mesmo de chegar o primeiro caso pra gente. Afetou como mulher, como mãe, como esposa. Agora, com a vacina, sentimos um acalento, vemos o futuro com mais fé. Mas só vou ficar tranquila quando todos da minha casa tomarem também”, afirma ela, que pela primeira vez, em 30 anos de casamento, não divide mais o quarto com o marido por medo de transmitir o vírus para quem tanto ama.
Dedicação
Histórias como a de Didi não são raridade entre as mulheres que atuam na linha de frente da covid-19. A técnica de Enfermagem Sandra Prates, também funcionária do Eduardo de Menezes, precisou pedir ao filho mais novo, de 16 anos, que fosse morar na casa do pai para que ela pudesse cumprir os plantões de 24 horas seguidas no hospital, dando suporte ao CTI e à ala de internação.
“É difícil. Eu trabalho 24h e folgo 24h, mas quando eu chego em casa de manhã, eu só preciso dormir. A vida pessoal fica parada. Não só a minha, mas a da maioria dos profissionais da Saúde. Uns adoeceram, outros cansaram. Os que estão no mercado hoje são guerreiros. Damos o ombro, o braço, o coração, nossa vida, nossa família”, relata.
A longa jornada de trabalho e a distância do filho dividem espaço com situações ainda mais angustiantes.
“De repente, a gente se depara com perguntas como ‘Moça, eu vou viver? Eu vou sair do tubo?’. Todas essas histórias que vivenciamos diariamente e a sensação de impotência são a parte mais difícil, porque tentamos de tudo, mas não conseguimos salvar todo mundo.”
Há duas semanas, após receber a segunda dose da vacina, Sandra pôde receber o filho de novo em casa.
“Agora fiquei mais tranquila, mesmo assim, continuo me isolando. Se um está na sala, o outro vai para o quarto. E mesmo vacinada, só fico no hospital ou dentro de casa, porque tem outras pessoas lá fora e eu não desejo isso para ninguém. Não é uma fase fácil, mas a minha fé é que tudo isso passe e o mundo se acalme”, torce Sandra.
Saúde mental
Enquanto os médicos e profissionais da Enfermagem se desdobram para manter a vida dos pacientes internados com covid-19, psicólogos como Palowa Emília Madureira Cruz, de 58 anos, lutam para garantir a saúde mental dos doentes.
Quando Palowa chega no Hospital Eduardo de Menezes, às 7h, para fazer o plantão de 12 horas, vai direto para a sala de acolhimento, onde recebe pertences dos pacientes, ajuda com os boletins médicos e conversa com os familiares. Depois, é o momento de dar suporte aos internados.
“Atendemos intercorrências, pacientes psiquiátricos, alguns que querem ir embora, que arrancam os equipamentos, pacientes chorando muito, fragilizados. É imprevisível. Falamos de pessoas e cada um reage de uma forma”, descreve.
Contato familiar
Outro papel importante dos profissionais da Psicologia é intermediar as chamadas de vídeo para permitir que os doentes mantenham o contato com a família durante o isolamento físico.
“Muitas vezes o paciente não consegue falar e a gente fica traduzindo, principalmente quando está muito cansado ou intubado. Tentamos mediar as relações, os afetos, para que o paciente receba motivação. Ele está sozinho, se sentindo abandonado, angustiado, com medo de morrer. A gente acaba virando parte da família dessas pessoas”, conta.
Entre os casos mais marcantes, Palowa cita dois. “Fiz o acolhimento de um paciente jovem na parte da manhã, com menos de 40 anos, e ele foi muito receptivo. Chegou a sentar no leito, falar dos projetos de vida, que queria se cuidar mais. Na parte da tarde, ele teve uma parada cardiorrespiratória e faleceu na enfermaria. Ele tinha propósitos e desejos na vida, sabe?”.
Outra história inesquecível foi de uma mulher, na faixa dos 40 anos, que estava evoluindo bem, mas teve uma parada em decorrência de embolia pulmonar.
“Dar essa notícia para o marido e o filho pré-adolescente foi muito difícil, porque ela estava melhorando, esperava-se uma resposta. O carinho e o afeto do marido foram muito marcantes. Ele falava ‘meu amor foi embora, meu amor foi embora’. A família foi desfeita de uma vez, de forma rápida, pela doença. É sempre o amor de alguém”, lembra ela.
Para manter a própria saúde mental em meio a tantos desafios, Palowa aproveita as poucas horas de descanso para fazer crochê, cozinhar, praticar atividades físicas e se distrair um pouco da pandemia que desafia a sanidade de mulheres, homens e crianças.
Todos eles têm algo em comum: o desejo de que tudo isso passe. E que, em breve, o Dia Internacional da Mulher, assim como tantas outras datas, volte a ser, de fato, um momento de comemoração.
Fonte: Agência Minas