Joe Biden vence Trump e é eleito 0 46º presidente dos Estados Unidos

Em três dias de disputa voto a voto, vitória do democrata sinaliza esgotamento dos norte-americanos com a política conservadora encampada pelo ex-presidente.



Joe Biden, 77 anos, foi eleito o 46º presidente dos Estados Unidos ao derrotar neste sábado, 7, o republicano Donald Trump. A vitória acirrada garante o retorno de um democrata à Casa Branca após quatro anos da gestão republicana, marcada pela polarização da sociedade norte-americana em meio à pandemia do novo coronavírus.

Kamala Haris, ex-senadora pela Califórnia, complementa a chapa vencedora e se torna a primeira mulher vice-presidente do país. A eleição de Biden foi confirmada após o triunfo no Estado da Pensilvânia, que deu ao democrata 273 delegados eleitorais, superando o mínimo de 270 representantes necessários para levar o Colégio Eleitoral. A disputa nos EUA é de forma indireta, e não necessariamente o candidato com o maior número de votos da população é o vencedor.

Na noite desta quinta-feira, 5, Trump chegou a se declarar novamente o vencedor da disputa ao afirmar que os adversários estavam tentando fraudar a contagens de votos, apesar de não ter apresentado nenhuma prova de irregularidade. O presidente disse que vai recorrer à Suprema Corte para garantir a sua permanência na Casa Branca.

A campanha republicana recorreu à Justiça para a recontagem de votos em Wisconsin, onde Trump perdeu por 0,6% dos votos. O mesmo pedido foi negado pelos Estados de Michigan e Geórgia. Em outra ação judicial, o ex-presidente enviou membros do partido para acompanhar a apuração na Pensilvânia, e também recorreu ao judiciário para impedir que os votos encaminhados pelo correio depois do dia oficial da eleição, 3 de novembro.


O triunfo de Biden — eleito sete vezes senador pelo Estado de Delaware e vice nos dois mandatos de Barack Obama —, sinaliza o esgotamento da sociedade norte-americana com a política conservadora encampada por Trump nos últimos quatro anos e indica a vontade de mudança na política externa, pautada principalmente pela disputa com a China e o afastamento de entidades internacionais.

Eleito aos 77 anos, o presidente com mais idade a assumir o cargo, o democrata também chega à Casa Branca diante de um país novamente dividido por questões raciais e traumatizado pelo envolvimento recorrente de policiais brancos em assassinatos de jovens negros. “A eleição de Biden é a continuidade da transformação que a sociedade dos EUA está demonstrando para termos críticos, como o conservadorismo, pautas dos movimentos negros, questões ambientais e a polarização da política.

É um indicativo de que temas que foram deixados de lado nos últimos anos estão voltando ao interesse do eleitorado”, afirma Pedro Brites, professor de relações internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) de São Paulo.

A escolha pelo candidato com o discurso menos pautado no ataque, e balizado na retomada do diálogo com aliados e adversários históricos, acende dúvidas sobre a nova postura da potência diante do crescimento da China. Apesar de todas as adversidades, democratas e republicanos falam a mesma língua quando se trata da necessidade de frear a sombra que o gigante asiático começa a projetar sobre o Tio Sam.

Para Alexandre Pires, professor de relações internacionais do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec), a diferença está na abordagem da situação. “O mundo já espera há ao menos 15 anos o reposicionamento dos Estados Unidos diante da China. O Trump ofereceu uma alternativa ao se afastar dos acordo multilaterais. O novo presidente precisa dar uma resposta para esta questão, pode ser na forma de criar uma arena multilateral para negociar com a China a adoção de compromissos econômicos”, afirma.

A eleição de Biden também chancela o fracasso da postura negacionista adotada por Trump diante da pandemia do novo coronavírus. O novo presidente foi eleito poucos dias depois de os EUA superarem a marca dos 9,7 milhões de infectados pela doença, enquanto o número de casos bate recordes diários. Até este sábado, o país já havia registrado mais de 236 mil mortes, segundo dados da Universidade Johns Hopkins.

Trump foi duramente criticado pela postura classificada como irresponsável, enquanto o país se isolava na dianteira em número de infecções e mortes. O próprio presidente foi diagnosticado com a Covid-19, mas voltou a minimizar os efeitos da doença ao compará-la com uma gripe comum. “A vitória de Biden representa uma guinada significativa dos EUA no tratamento do novo coronavírus. Entre as primeiras medidas, devem estar novas formas para conter a pandemia, a adesão às normas da Organização Mundial da Saúde e a busca por cooperação internacional”, diz Brites.


Biden e o Brasil

A gestão de Biden também deve recolocar os Estados Unidos no centro das discussões globais, como a proteção do meio ambiente, cooperação para desmantelar organizações criminosas ao redor do mundo e outros assuntos tratados de forma ampla, diferente do viés multilateral empregado por Trump desde 2016.

A forma como Biden vai se relacionar com o restante do mundo deve trazer prejuízos ao Brasil. “Haverá uma nova importância dos fóruns multilaterais, e nesses ambientes há maior foco em países europeus e na China. Isso deixa o Brasil em uma posição difícil, ainda mais quando se tem que disputar espaço com outros países”, afirma Pires, do Ibmec.

As constantes declarações do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em apoio à reeleição de Trump, e a recente rusga com Biden no Twitter pelas críticas que o então candidato fez sobre a política de preservação da floresta amazônica, não ajudam a melhorar a situação do país com o novo mandatário. “Não foi apenas uma aproximação de dois países, mas houve um apoio particular de Bolsonaro à Trump, e isso não cria um clima bom com Biden”, afirma Brites.

O começo errante pode ser remediado pela baixa significância que o país tem atualmente aos EUA. “O Brasil é um país de pouca prioridade aos Estados Unidos. A não ser que ocorra alguma crise que chame a atenção da opinião mundial, o foco dos norte-americanos deve ficar voltado para a China e para a resolução da pandemia”, afirma o professor da FGV.

Fonte: Jovem Pan