População carente: Luz e água não poderão ser suspensas por falta de pagamento



Tramita na Câmara dos Deputados do Brasil o Projeto de Lei número 4176/2008, que altera a Lei 8.987, de 13 de fevereiro de 1995 e tem como objetivo vedar a interrupção da prestação de serviços públicos por inadimplemento de obrigações quando se tratar de usuário economicamente hipossuficiente.

A mudança na legislação prevê que a interrupção somente poderá ocorrer mediante ordem judicial. Ainda assim, não será possível a suspensão em vésperas de feriados e nos finais de semana.

Atualmente basta a comunicação formal para que a concessionária possa proceder ao desligamento dos serviços. Neste sentido a Lei 11.455/2007, que versa sobre saneamento básico:


Art. 40. Os serviços poderão ser interrompidos pelo prestador nas seguintes hipóteses:

III - negativa do usuário em permitir a instalação de dispositivo de leitura de água consumida, após ter sido previamente notificado a respeito;

V - inadimplemento do usuário do serviço de abastecimento de água, do pagamento das tarifas, após ter sido formalmente notificado.

§ 1o As interrupções programadas serão previamente comunicadas ao regulador e aos usuários;

§ 2o A suspensão dos serviços prevista nos incisos III e V do caput deste artigo será precedida de prévio aviso ao usuário, não inferior a 30 (trinta) dias da data prevista para a suspensão.

A mesma Lei fala sobre casos excepcionalíssimos em que o corte deve atender a requisitos mais rigorosos:


Art. 40. Omissis ...

§ 3o A interrupção ou a restrição do fornecimento de água por inadimplência a estabelecimentos de saúde, a instituições educacionais e de internação coletiva de pessoas e a usuário residencial de baixa renda beneficiário de tarifa social deverá obedecer a prazos e critérios que preservem condições mínimas de manutenção da saúde das pessoas atingidas.

No mesmo sentido - entendendo pela possibilidade de interrupção por falta de pagamento - a Lei 8987/05, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos:


Art. 6o Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato.

§ 3o Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso, quando:

I - motivada por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações; e,
II - por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade.

Justificativa do projeto que impede o corte de água e luz para população carente

A iniciativa de lei tem as seguintes justificativas para evitar que pessoas de baixa renda tenham serviços essenciais interrompidos:

# A continuidade dos serviços públicos é um direito do usuário;

# Usuários economicamente hipossuficientes enfrentam maiores dificuldades para garantir o próprio sustento e o de suas famílias, condição que algumas vezes as impedem momentaneamente de saldar seus compromissos;

# O Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990) prevê tratamento diferenciado no caso de hipossuficiência.


Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências.

A justificação deixa claro que a PL não tem como objetivo isentar e/ou anistiar as pessoas carentes, cabendo às empresas recorrer aos meios tradicionais de cobrança sem, contudo, interromper os serviços.

Publicado originalmente no Blog Abrahão Nascimento

Abrahão NascimentoAdvogado empreendedor
Advogado. Sócio-fundador do Escritório Abrahão Nascimento advocacia (2012). Escritor. Especialista em relações de consumo, com forte atuação contra instituições financeiras e planos de saúde. Especialista em Direito de família. Site: www.abrahaonascimento.com.br