Príncipe imperial defende monarquia em MG e afirma que homossexualidade é um 'defeito'

Dom Bertrand de Orleans e Bragança deu declaração polêmica em festival literário 130 anos após passagem de Dom Pedro II em Poços de Caldas





O teatro do Espaço Cultural da Urca, em Poços de Caldas (MG), não está cheio, porém abriga um público considerável que acompanha a palestra de Dom Bertrand de Orleans e Bragança na noite desta segunda-feira (1º). No ano em que completam 130 anos da visita de Dom Pedro II à cidade sulmineira, o príncipe imperial do Brasil ocupa o palco para falar sobre um suposto ecoterrorismo e teorias pró-monarquistas. Durante a palestra, o público se revezou entre olhares perplexos e salvas de palmas após as declarações conservadoras de Dom Bertrand: “Eu vejo o 'homossexualismo' como um defeito”.

Dom Bertrand é o terceiro de 12 filhos do príncipe Dom Pedro Henrique de Orleans e Bragança, herdeiro da família imperial brasileira. É bisneto da Princesa Isabel - que entre seus feitos, tem a abolição da escravatura no Brasil - e trineto do Imperador Dom Pedro II, último monarca dos brasileiros.

O príncipe participa da 12ª edição do Festival Literário de Poços de Caldas (Flipoços) para falar de seu livro “Psicose Ambientalista - Os Bastidores do Ecoterrorismo para implantar uma Religião Ecológica Igualitária e Anticristã”. Para Dom Bertrand, todo o discurso de que o meio ambiente está sendo destruído pela civilização e o Brasil não preserva suas riquezas pode ser resumido em uma palavra: mito.




“A bandeira vermelha [o socialismo] se transformou em bandeira verde [ecológica]. É um exagero. Esses mitos ambientais não têm nenhum fundamento científico”, afirma o príncipe. Para corroborar suas ideias, Dom Bertrand cita dados paradoxais com os comumente divulgados pelos ambientalistas, como por exemplo, que 97% do Estado do Amazonas está intacto e que 61% da vegetação do Brasil está do mesmo jeito que na época do descobrimento.

“Existe uma campanha internacional de que o Brasil está queimando o pulmão do mundo, que pecuaristas estão acabando com a Amazônia. É tudo mentira.”


Vida rural

Antes de falar sobre seu livro, o príncipe imperial voltou ao tempo de sua infância e contou sobre a volta ao Brasil. Nascido em 1941 em Mandelieu, na França, onde seus pais ficaram após o exílio da família imperial e a Segunda Guerra Mundial, o príncipe pisou em solo brasileiro com 4 anos de idade. Passou a infância na zona rural do Paraná.

Já somando 75 anos, ele lembra do período com nostalgia, e ironicamente, agradece por ter crescido no campo e considera que a experiência foi primordial para sua formação como pessoa. O príncipe relatou que passava boa parte do tempo plantando hortaliças na fazenda da família - que segundo ele, chegou ao Brasil sem nenhum patrimônio. Nas horas vagas, ensinava os princípios cristãos aos filhos dos “colonos”, em suas palavras, que eram vizinhos da propriedade da família.

Aproveitando a instabilidade política em tempos pré-impeachment, Dom Bertrand reapareceu na mídia durante alguns protestos pregando a volta da monarquia ao Brasil. A formação ultraconservadora cristã, que o fez se declarar na palestra “católico, graças a Deus”, talvez seja responsável pelas ideias mais polêmicas que o príncipe cita em seus discursos, e que divide o público entre total indignação e apoio fervoroso dos adeptos ao sistema imperial.

Ao abrir para as perguntas da plateia, um dos jovens que trabalhava para o governo com comunidades indígenas o questionou sobre a situação das tribos, que sofrem dificuldades por não viver na floresta, ao mesmo tempo que também não estão inseridos na sociedade.

O príncipe repetiu com convicção o comentário que havia feito alguns minutos antes, quase uma volta ao tempo em que o Brasil foi descoberto. “As pessoas dizem que tem que deixar os índios no mato. Qual o maior bem que você pode dar para os índios? A catequese. [...] Os índios, assim como todos os homens, deviam se submeter aos 10 mandamentos [da Bíblia].” Logo após a declaração, um grupo de jovens resolveu enfaticamente se levantar e deixar a plateia do teatro.

O mesmo rapaz o questionou então sobre a homossexualidade, que o príncipe havia declarado momentos antes que achava errado. Dom Bertrand, mais uma vez, manteve suas convicções ideológicas e declarou: “Eu vejo o homossexualismo como um defeito. A doutrina católica vê. E a maioria também vê.” O príncipe foi ovacionado pela plateia, que encheu o teatro em uma longa salva de palmas.


A volta dos monarcas?


Uma comprida fila se forma ao longo dos bastidores do Teatro da Urca para um autógrafo do príncipe imperial. Pedro Lucas da Silva Brito Ferreira, de 13 anos, desfila pra lá e pra cá com um boné verde e amarelo e a inscrição “monarquia” acima da nuca. Veio com a família, de Machado (MG), acompanhar a palestra de Dom Bertrand.

O pai dele, Alexandre Purita, de 41 anos, é professor de história e conta que acompanha a campanha pró-monarquia há quase 15 anos depois que o filho mais velho o “apresentou” à família real. Outros quatro professores vieram da cidade para assistir a palestra. O objetivo: resgatar o que Dom Pedro fez pelo Brasil.

No fim da fila, está Luiz Otavio Luciano Galdino, representante do Círculo Monárquico de Poços de Caldas. Fundado em 2 de dezembro do ano passado, com nove pessoas, o grupo se reúne uma vez por mês para discutir ideias pró-monarquistas e tentar angariar adeptos ao novo sistema político. Segundo ele, há pessoas de todas as idades, desde adolescentes até cerca de 40, 50 anos.

“Por enquanto, nós estamos com um trabalho de esclarecimento: [o povo pensa] ‘monarquia absolutista, Dom Pedro não fazia nada’. Então é um trabalho de educação do povo, que monarquia não é escravidão, que você ter uma pessoa preparada desde pequena para governar o país é legal. Não que monarquia seja melhor que república, todo sistema no papel é maravilhoso, mas na prática que você vê que república no Brasil não funciona.”

Surpreendentemente se declarando “de esquerda”, Luiz acredita que as ideias ultraconservadoras da família imperial é o que talvez compliquem o retorno da monarquia ao Brasil. “Se você quer o retorno de uma família que deixou o Brasil há 128 anos, você precisa do apoio popular.”

Dom Bertrand acredita que o movimento que ele está fazendo é justamente de opinião pública, e não um partido político. “É um despertar de um sentimento nacional que quer o retorno de um regime que garanta que o Brasil venha a ser aquilo que nós sonhamos. Um Brasil bonito, honesto.”

Para o príncipe, a origem da corrupção no Brasil é em parte originada pela república e a outra parte, pela descristianização do país, e somente a religião e essa educação religiosa salvaria a população. Ele não soube dizer o que mudaria de forma prática ou política se voltasse ao governo amanhã. Somente visualiza um governo parlamentar e monárquico, em que a realeza fizesse o trabalho difícil da educação popular. “É uma orientação psicológica, que tende a estimular a virtude do seu povo. Seria muito mais moral e religioso do que qualquer outra coisa.”


Fonte: G1 Sul de Minas