Será que mesmo eu estando casado, meus pais têm direito à minha herança quando eu falecer?
Muita gente acredita que após o casamento os pais perdem qualquer direito sobre eventual herança dos filhos.
A ordem natural das coisas, como regra geral, é que os pais cheguem ao fim da vida antes de seus filhos. No entanto, não é difícil encontrar tristes exceções em que um pai ou uma mãe tem que enterrar seu (sua) filho (a).
Quando isso acontece, é de sabedoria popular que, sendo o (a) filho (a) solteiro (a), divorciado (a), ou viúvo (a), seus bens serão transmitidos em herança aos pais.
Contudo, quando o (a) filho (a) é casado (a) ou vive em união estável, quase todo mundo pensa que apenas a (o) esposa (o) ou companheira (o) será a (o) beneficiária (o) no inventário.
Porém, para a surpresa de muitos, a situação não é bem assim.
A maioria das pessoas pensa que o matrimônio tira dos genitores a condição de herdeiros de seus respectivos filhos. Isso não é verdade.
Os descendentes, os ascendentes e o cônjuge são herdeiros necessários[1], isto é, não podem ser excluídos da participação na herança[2]-[3].
Tal não significa que sempre estarão presentes no inventário os descendentes, os ascendentes e o cônjuge[4].
O que irá dizer quem vai participar em cada situação, e o quanto receberá, é o caso concreto analisado[5].
Assim, urge explicar quando os pais (ascendentes[6]) participarão da herança dos filhos.
Filhos solteiros, divorciados ou viúvos que não tenham descendentes[7]: a sabedoria popular está correta. Com efeito, quando alguém morre sem deixar filhos, nem marido/mulher ou companheiro (a), porém tendo pais vivos, são estes os únicos herdeiros[8].
Filhos casados[9] ou em união estável que tenham descendentes: outra vez o senso comum está certo. De fato, a partilha de bens será feita apenas entre o cônjuge e os descendentes, excluídos os ascendentes[10].
Filhos casados ou em união estável que não tenham descendentes: eis aqui a surpresa para muitos; mesmo sendo o (a) filho (a) casado (a) ou tendo vivido em união estável, mas não tendo deixado descendentes, os ascendentes também têm direito à herança[11]-[12]. Eles participarão do inventário junto com o cônjuge ou companheiro (a).
[1] Ver art. 1.845 do Código Civil.
[2] Exceto se for deserdado (clique aqui para ler meu artigo sobre deserdação) ou considerado indigno (cf. Arts. 1.814 e ss. Do CC).
[3] O (a) companheiro (a) não é herdeiro (a) necessário (a), mas, salvo estipulação em contrário feita em testamento, participará da herança, nos ditames do art. 1.790 do CC/2002.
[4] Quanto à situação do companheiro, cf. Nota de rodapé nº. 3.
[5] Sob o inarredável parâmetro do art. 1.829 do Codex Substantivo Civil, ou do art. 1.790 do mesmo diploma normativo, no caso de o de cujus ter vivido sob união estável.
[6] Os ascendentes não se limitam aos pais de alguém, cabendo igualmente no conceito os avós, bisavós, etc.. Nesse diapasão, em toda referência aos pais feita neste artigo, pode-se ler avós, bisavós e etc..
[7] Descendentes não são apenas filhos; são também netos, bisnetos, etc..
[8] É o que se dessume da hermenêutica do art. 1.829, II, da Lei Federal nº. 10.406/2002.
[9] De bom alvitre atentar-se para as polêmicas exceções da participação do marido ou da mulher na herança do outro a depender do regime de bens escolhido. Há notória e intensa divergência na doutrina e na jurisprudência (o Superior Tribunal de Justiça gravitou em várias teorias distintas) sobre a temática da interpretação a ser dada ao inc. I do art. 1.829 do CC.
[10] Vide art. 1.829, inciso I, do CC/02.
[11] Art. 1.829, II, CC: “Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:
(Omissis)
II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;”
Art. 1.790, III, Código Civil: “Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:
(…)
III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;”
[12] Para saber como será calculada a parte de cada um, recomendo o estudo dos arts. 1.837 e 1.790, III, do Código Civil. Por demandar tamanho aprofundamento, não tratarei neste artigo do tema, para não fugir do enfoque e para não tornar a leitura extensa, complexa e cansativa. Tal tema seria merecedor de um artigo próprio.
Paulo Henrique Brunetti Cruz
Sócio Honorário da Academia Brasileira de Dir. Processual Civil
Sócio Honorário da Academia Brasileira de Direito Processual Civil – ABDPC. Membro Efetivo da Associação de Direito de Família e das Sucessões - ADFAS. Ex-Adjunto da Procuradoria dos Municípios de Marilac/MG e Jampruca/MG. Ex-Adjunto da Procuradoria das Câmaras Municipais de Alpercata/MG, Jampruca/MG e Periquito/MG. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito do Vale do Rio Doce – FADIVALE. Advogado militante nas áreas de Direito de Família, Direito das Sucessões (Inventário) e Direito Público Municipal. Parecerista. Articulista jurídico.
Sócio Honorário da Academia Brasileira de Direito Processual Civil – ABDPC. Membro Efetivo da Associação de Direito de Família e das Sucessões - ADFAS. Ex-Adjunto da Procuradoria dos Municípios de Marilac/MG e Jampruca/MG. Ex-Adjunto da Procuradoria das Câmaras Municipais de Alpercata/MG, Jampruca/MG e Periquito/MG. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito do Vale do Rio Doce – FADIVALE. Advogado militante nas áreas de Direito de Família, Direito das Sucessões (Inventário) e Direito Público Municipal. Parecerista. Articulista jurídico.