Existência de transmissor fora das matas preocupa autoridades.
O número de casos de febre amarela em Minas Gerais, tanto em humanos quanto em macacos, tem trazido uma nova preocupação para os municípios: a de que a doença volte a circular em áreas urbanas, meio do qual estava erradicada desde a década de 1940. Fora das matas, o principal vetor do vírus é um dos maiores vilões das autoridades em saúde nos últimos anos, o mosquito Aedes aegypti, também transmissor da dengue, febre chikungunya e zika. "A preocupação é real", afirma a pesquisadora do Departamento de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Lavras (Ufla-MG), Joziana Barçante.
Segundo o último relatório divulgado pela Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais, o estado registrava, até sexta-feira (10), 987 notificações de febre amarela, das quais 57 foram descartadas e outras 198 estavam confirmadas em 39 municípios. Do total de confirmações, 68 eram de pessoas que morreram. Além disso, em 65 cidades foram confirmadas mortes de macacos por febre amarela e, em alguns casos, os corpos foram encontrados próximos de áreas urbanas.
No Sul de Minas, foram diagnosticados quatro casos da doença, todos na zona rural de Delfinópolis (MG), microrregião de Passos (MG). A morte de um macaco com febre amarela também foi confirmada em Poços de Caldas (MG). O corpo do animal foi localizado em 25 de janeiro no Centro da cidade.
As cidades de Campestre (MG), Claraval (MG), Claraval (MG), Andradas (MG), Caldas (MG), Ibitiúra de Minas (MG), Ouro Fino (MG), Santa Rita de Caldas (MG), Toledo (MG) e Campanha (MG) também tiveram notificações de macacos mortos, mas não foi possível coletar material para análise. Em Lavras (MG) e Três Pontas (MG), há casos em investigação. Na última semana, dois macacos foram encontrados mortos em Varginha (MG), em áreas urbanas cercadas por mata, e no domingo (12), outro caso foi registrado em Caldas, conforme informações das prefeituras dessas cidades.
De acordo com Joziana Barçante, há indícios de que o vírus da febre amarela pode, em breve, não estar mais restrito a áreas silvestres.
"Se a gente pegar na década de 1940, quando foi feito o grande trabalho nacional de erradicação do Aedes aegypti no Brasil, o foco era febre amarela - casos de febre amarela no ambiente urbano e o Aedes aegypti presente no ambiente urbano. O ambiente foi controlado, teve a vacinação e ela [a doença] passou a ter um ciclo primariamente silvestre. Como a gente está começando a ter casos em relação ao ambiente peri-silvestre [no entorno da mata], existe a preocupação em relação a isso", observa.
Risco do ciclo urbano
A febre amarela, doença febril aguda que, em situações mais graves, causa insuficiência renal e hepática e pode levar à morte, possui dois ciclos de infestação, um silvestre e outro urbano. Na mata, o vírus circula naturalmente, entre mosquitos e algumas espécies de macacos. No ciclo urbano, uma pessoa infectada pode manter a circulação do vírus ao ser picada pelo pernilongo, que se torna o novo hospedeiro da doença e pode transmiti-la para outras pessoas.
"Os mosquitos do gênero Haemagogus e S. Cleropterius mantêm o vírus da febre amarela circulante no ambiente silvestre, mas, quando a pressão viral aumenta muito, ou em função dessa invasão de ambiente silvestre, a gente pode ter o vírus passando a circular no ambiente urbano. Se você tem o indivíduo infectado no ambiente urbano, onde tem o mosquito transmissor, que é o Aedes aegypti (e o Aedes albopictus também), você pode ter o ciclo da doença se instalando no ambiente urbano", explica Joziana Barçante.
Por email, a Secretaria de Saúde de Minas Gerais informou ao G1 que o combate aos focos desse mosquito é constante, uma vez que ele está ligado a diversas doenças, além da febre amarela. "Até o momento, não há casos de transmissão da febre amarela urbana no país, que tem o Aedes como vetor. De todo modo, a secretaria está atenta e mantém as ações que já são de rotina para evitar o mosquito e nos períodos de maior calor, como é o caso de agora, as ações são intensificadas", disse o órgão.
Na busca pelo controle do pernilongo
Desde a primeira semana de 2017, os focos de Aedes estão na mira das equipes de saúde em Passos (MG). Em 2014, mais de 1.500 moradores tiveram dengue e oito pessoas, morreram por complicações da doença. Em 2016, 1.300 casos de dengue foram notificados até outubro. Com a disseminação de febre chikungunya, zika e, agora, febre amarela, a preocupação de bloquear o transmissor se tornou ainda mais urgente.
"A preocupação aumentou porque a principal prevenção é eliminar os focos do mosquito transmissor", diz a diretora de Saúde Coletiva do município, Paulene Cirino. "A gente fez um levantamento dos pontos onde as ações devem se concentrar, por meio do LIRAa, que é o Levantamento de Índice Rápido de Aedes aegypti, e colocamos as equipes nas ruas, com visita de casa em casa, panfletagem, blitz educativo no trânsito e no comércio, abordando mesmo a população", relata.
Passos é um polo de confecção, que fica na divisa entre o Sul e o Centro-Oeste de Minas e possui 113.807 habitantes, conforme estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No início de fevereiro, foi incluída na chamada área de risco para febre amarela por estar a menos de 70 Km de Delfinópolis. A cidade ainda apresenta médio risco de infestação do Aedes.
O mosquito é considerado dentro do controle, segundo a Secretaria de Saúde Estadual, quando a taxa de infestação é inferior a 1%. Na primeira quinzena de janeiro, quando o LIRAa foi divulgado, os focos estavam presentes em 1,7% dos 2.234 imóveis visitados pelo Núcleo de Controle de Zoonoses municipal.
Em Varginha (MG), que fica a cerca de 200 Km de Passos, 80 focos de Aedes foram encontrados nos primeiros 13 dias do ano, o maior registro desde que o mutirão de limpeza começou a ser feito nos bairros, em 2012.
Com o aparecimento de dois macacos mortos na cidade, a busca por larvas aumentou, junto com outros trabalhos preventivos, como a limpeza de lotes e vacinação de famílias de casa em casa.
Em Alfenas (MG), que teve 3,9 mil notificações de casos de dengue em 2016, a preocupação não é menor e, em um dos mutirões organizados na cidade, no final de janeiro, todos os funcionários da prefeitura foram para a rua fazer o trabalho de prevenção ao pernilongo. A Gerência Regional da Saúde, sediada na cidade, realizou uma palestra na quinta-feira (9) para orientar sua equipe técnica sobre a importância de combater o mosquito e a relação dele com dengue, febre amarela, chikungunya e zika. Sem fórmula
Para a pesquisadora da Ufla, Joziana Barçante, mobilizações como as de Passos, Alfenas e Varginha, junto com a cobertura vacinal, são um importante caminho para que a febre amarela urbana não volte.
"Hoje, com a densidade populacional que a gente tem e a quantidade de lixo urbano que a gente produz, eu sou capaz de praticamente afirmar que erradicar o Aedes aegypti é impossível. A gente tem que trabalhar medidas de controle, minimizar a quantidade de insetos. Se você tem uma quantidade reduzida, você minimiza o índice de dengue e todas as outras doenças virais que são transmitidas pelo Aedes", afirma.
À frente da Coordenadoria de Prevenção de Endemias da instituição, Joziana acompanha desde 2012 estudantes e outros pesquisadores no desenvolvimento de projetos de combate ao popularmente conhecido "mosquito transmissor da dengue". No próprio campus da universidade, armadilhas artesanais são construídas para catalogar as variedades encontradas do mosquito e definir as medidas de monitoramento e controle.
Palestras em escolas da cidade e o incentivo para que os funcionários tirem 10 minutos do horário de trabalho todas as sextas-feiras para checarem se o ambiente de trabalho não virou um criadouro do Aedes fazem parte da rotina implementada para um combate que não tem fórmula.
"As pessoas veem que o terreno do vizinho está sujo, mas o monitoramento dentro da própria casa toda semana não é todo mundo que faz e, às vezes, um saquinho plástico que cair, uma garrafa, um pneu, a tampa da caixa d'água com lona, podem acumular a água que vai permitir o desenvolvimento das larvas", explica Joziana. "Uma fêmea pode botar até 30 ovos de uma vez e, em uma tampinha de garrafa, podem botar mais de uma fêmea. Sem água, esses ovos podem durar mais de um ano, até que a água acumule naquele local e favoreça as larvas."
Desde a primeira semana de 2017, os focos de Aedes estão na mira das equipes de saúde em Passos (MG). Em 2014, mais de 1.500 moradores tiveram dengue e oito pessoas, morreram por complicações da doença. Em 2016, 1.300 casos de dengue foram notificados até outubro. Com a disseminação de febre chikungunya, zika e, agora, febre amarela, a preocupação de bloquear o transmissor se tornou ainda mais urgente.
"A preocupação aumentou porque a principal prevenção é eliminar os focos do mosquito transmissor", diz a diretora de Saúde Coletiva do município, Paulene Cirino. "A gente fez um levantamento dos pontos onde as ações devem se concentrar, por meio do LIRAa, que é o Levantamento de Índice Rápido de Aedes aegypti, e colocamos as equipes nas ruas, com visita de casa em casa, panfletagem, blitz educativo no trânsito e no comércio, abordando mesmo a população", relata.
Passos é um polo de confecção, que fica na divisa entre o Sul e o Centro-Oeste de Minas e possui 113.807 habitantes, conforme estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No início de fevereiro, foi incluída na chamada área de risco para febre amarela por estar a menos de 70 Km de Delfinópolis. A cidade ainda apresenta médio risco de infestação do Aedes.
O mosquito é considerado dentro do controle, segundo a Secretaria de Saúde Estadual, quando a taxa de infestação é inferior a 1%. Na primeira quinzena de janeiro, quando o LIRAa foi divulgado, os focos estavam presentes em 1,7% dos 2.234 imóveis visitados pelo Núcleo de Controle de Zoonoses municipal.
Em Varginha (MG), que fica a cerca de 200 Km de Passos, 80 focos de Aedes foram encontrados nos primeiros 13 dias do ano, o maior registro desde que o mutirão de limpeza começou a ser feito nos bairros, em 2012.
Com o aparecimento de dois macacos mortos na cidade, a busca por larvas aumentou, junto com outros trabalhos preventivos, como a limpeza de lotes e vacinação de famílias de casa em casa.
Em Alfenas (MG), que teve 3,9 mil notificações de casos de dengue em 2016, a preocupação não é menor e, em um dos mutirões organizados na cidade, no final de janeiro, todos os funcionários da prefeitura foram para a rua fazer o trabalho de prevenção ao pernilongo. A Gerência Regional da Saúde, sediada na cidade, realizou uma palestra na quinta-feira (9) para orientar sua equipe técnica sobre a importância de combater o mosquito e a relação dele com dengue, febre amarela, chikungunya e zika. Sem fórmula
Para a pesquisadora da Ufla, Joziana Barçante, mobilizações como as de Passos, Alfenas e Varginha, junto com a cobertura vacinal, são um importante caminho para que a febre amarela urbana não volte.
"Hoje, com a densidade populacional que a gente tem e a quantidade de lixo urbano que a gente produz, eu sou capaz de praticamente afirmar que erradicar o Aedes aegypti é impossível. A gente tem que trabalhar medidas de controle, minimizar a quantidade de insetos. Se você tem uma quantidade reduzida, você minimiza o índice de dengue e todas as outras doenças virais que são transmitidas pelo Aedes", afirma.
À frente da Coordenadoria de Prevenção de Endemias da instituição, Joziana acompanha desde 2012 estudantes e outros pesquisadores no desenvolvimento de projetos de combate ao popularmente conhecido "mosquito transmissor da dengue". No próprio campus da universidade, armadilhas artesanais são construídas para catalogar as variedades encontradas do mosquito e definir as medidas de monitoramento e controle.
Palestras em escolas da cidade e o incentivo para que os funcionários tirem 10 minutos do horário de trabalho todas as sextas-feiras para checarem se o ambiente de trabalho não virou um criadouro do Aedes fazem parte da rotina implementada para um combate que não tem fórmula.
"As pessoas veem que o terreno do vizinho está sujo, mas o monitoramento dentro da própria casa toda semana não é todo mundo que faz e, às vezes, um saquinho plástico que cair, uma garrafa, um pneu, a tampa da caixa d'água com lona, podem acumular a água que vai permitir o desenvolvimento das larvas", explica Joziana. "Uma fêmea pode botar até 30 ovos de uma vez e, em uma tampinha de garrafa, podem botar mais de uma fêmea. Sem água, esses ovos podem durar mais de um ano, até que a água acumule naquele local e favoreça as larvas."