Nos últimos dias, os dez presos que compõem o coral Vozes da Cela, do Presídio de São Lourenço, no Sul de Minas, tiveram que se esmerar nos ensaios para dar conta da temporada de apresentações natalinas. Elas começaram no último fim de semana, primeiramente no interior do Fórum local e depois, em duas edições, em praça pública, no Parque das Águas.
O interesse da população pelo coral cresceu depois que o grupo alcançou a etapa final da versão de 2015 do Prêmio Innovare, que reconhece e premia práticas que ajudam a melhorar a qualidade do atendimento da Justiça no Brasil.
O coral começou em 2008 como atividade extracurricular da Escola Estadual São Francisco de Assis, instalada dentro do presídio, e, com o passar do tempo, tornou-se conhecido e reconhecido pela comunidade.
Os ensaios são feitos dentro da escola, que também atua como parceira, complementando os conhecimentos necessários para as apresentações. A professora de inglês, por exemplo, ajudou os presos a dominarem a letra da música White Christmas (Natal Branco), ensinando-lhes o significado e a pronúncia de cada palavra.
Esse envolvimento dos educadores com o Vozes da Cela chega às raias da paixão no maestro João Henrique Martins. Não parece falar de um grupo de presos quando se refere ao coral que dirige. “Fico enobrecido realizando esse trabalho. Tenho vozes aqui que, se quiserem, poderão cantar profissionalmente”, diz o regente.
Seleção
Mas não basta apenas talento e boa conduta para ser admitido no Vozes da Cela. O preso tem de estudar e trabalhar. Foi assim com Magnus dos Santos. Ele havia parado os estudos na 5ª série e resistia a voltar para a sala de aula. Mas falou mais alto a vontade que sentia na cela, ao ouvir de longe os ensaios do coral. Magnus fez a última série do Ensino Fundamental neste ano e trabalha como auxiliar de serviços gerais na Delegacia de Polícia de São Lourenço, ao lado do presídio.
“Sinto alegria e conforto quando me apresento (no coral). É uma forma de mudar a maneira como somos vistos pela sociedade”, diz.
O presídio recebe homens que cumprem o regime aberto, semiaberto e fechado. Com isso, os detentos de um regime mais flexível, servem de referência para os outros que estão em um mais restritivo. Isso estimula a evolução e a participação deles nas atividades de reinserção social.
O juiz de da Vara Criminal de São Lourenço, Fábio Macedo, foi o responsável pela inscrição do Vozes da Cela no Prêmio Innovare 2015 e acompanha de perto as atividades do coral. Não por acaso, autoriza as apresentações fora do presídio. “A boa convivência do Judiciário com a direção do sistema prisional é primordial para acelerar o acesso dos presos aos direitos garantidos legalmente”, observa o magistrado.
Disseminando boas práticas
O sucesso do Vozes da Cela vem inspirando outras unidades da Subsecretaria de Administração Prisional (Suapi) da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds), como o Presídio de Caxambu, exclusivamente feminino, a 30 quilômetros de São Lourenço. Dez presas compõem o coral Canto Livre e soltam a voz, também sob a batuta do maestro João Henrique. A presa Juliane Rodrigues diz que o canto para ela é uma espécie de renovação do espírito. “É um momento de descontração, quando posso expressar meus sentimentos”, explica.
Por Dayana Silva
Fotos e vídeo: Carlos Alberto/Imprensa MG
Agência Minas