Doce à base de amendoim e rapadura atrai consumidores de todo o país.
Da cozinha, o cheiro de amendoim torrado exala. Logo o ar é tomado pela rapadura fresca- derretida, quente, doce. Lentamente, como um casal apaixonado, eles se misturam e se embalam. Aos poucos, surge uma iguaria quase octagenária. "Uma joia rara", diria o poeta Carlos Drummond de Andrade lá nos idos de 1953, em carta deixada na cidade. Quem experimenta o pé de moleque feito em Piranguinho (MG) de lá não esquece jamais.
“Eu compro sempre aqui e uma vez que escolhi o pé de moleque de outro lugar, meu filho logo percebeu a diferença”, conta o eletricitário João Batista da Silva, de 52 anos, que há décadas é cliente de uma das barracas que tomam conta da extensão da BR-459.
Vermelha, amarela, marrom, prata, um arco-íris. As cores identificam a família que tira horas do seu dia para produzir um doce que já tornou a pequena cidade sulmineira em uma referência no país.
Neste sábado (20), parte dos 13 produtores se uniu para formar o maior pé de moleque do mundo- 20 metros só de comprimento. Nem precisava tanto. Os cerca de 8 mil visitantes diários da tradicional festa em que a mistura de amendoim com rapadura é celebrada já são prova suficiente da preferência nacional.
Foi no fogão de lenha da casa da avó de Sônia Torino que a tradição do pe de moleque começou. Uma renda extra para a então humilde família que lutava para tocar a vida no Sul de Minas no início do século 20. “Meu avô veio para cá para cuidar do então porto que existia no Rio Sapucaí. Mas não deu certo e ele virou chefe da estação ferroviária de Piranguinho”, conta Sônia, que mora na rua construída atrás da casa onde funcionava a antiga estação.
Desde 2012, a Barraca Vermelha tem a estrutura de um charmoso café. Ainda às margens da BR-459, é incrível a quantidade de veículos que ali para a todo o momento para comprar a base de sua existência: o famoso doce de amendoim de Piranguinho.
O pé de moleque é embrulhado na hora, praticamente quente. Quase não há espaço para a concorrência: uma das filhas de Sônia abriu uma fábrica para oferecer amendoim temperado e pé de moça, outra pretende desenvolver a versão de paçoca do produto e, no entanto, quem reina no balcão é o pé de moleque.
A empresa, que antes só tinha a dona Alcéia como produtora, hoje conta com a ajuda de 15 funcionários, entre doceiros e balconistas. A produção triplicou em 80 anos e é requisitada até por quem teve que ir embora do país: por email, Sônia já recebeu encomenda até do Iraque.
Aos fundos, a “fábrica”, onde a única máquina presente é o descascador de amendoim torrado. A cozinha ainda adota os padrões da tia empreendedora: bons fogões e braços para misturar amendoim e rapadura, base do legítimo pé de moleque de Piranguinho que tantas histórias ajuda a escrever.
“Eu compro sempre aqui e uma vez que escolhi o pé de moleque de outro lugar, meu filho logo percebeu a diferença”, conta o eletricitário João Batista da Silva, de 52 anos, que há décadas é cliente de uma das barracas que tomam conta da extensão da BR-459.
Vermelha, amarela, marrom, prata, um arco-íris. As cores identificam a família que tira horas do seu dia para produzir um doce que já tornou a pequena cidade sulmineira em uma referência no país.
Neste sábado (20), parte dos 13 produtores se uniu para formar o maior pé de moleque do mundo- 20 metros só de comprimento. Nem precisava tanto. Os cerca de 8 mil visitantes diários da tradicional festa em que a mistura de amendoim com rapadura é celebrada já são prova suficiente da preferência nacional.
Foi no fogão de lenha da casa da avó de Sônia Torino que a tradição do pe de moleque começou. Uma renda extra para a então humilde família que lutava para tocar a vida no Sul de Minas no início do século 20. “Meu avô veio para cá para cuidar do então porto que existia no Rio Sapucaí. Mas não deu certo e ele virou chefe da estação ferroviária de Piranguinho”, conta Sônia, que mora na rua construída atrás da casa onde funcionava a antiga estação.
Para ajudar na renda da família, Matilde Cunha Torino fazia vários doces, vendidos nos vagões por crianças da cidade- um deles, o preferido, o pé de moleque. “Os meninos passavam de vagão em vagão e dizem que meu avô chegava a atrasar a partida para que todos os passageiros fossem visitados”, diz, divertida, a atual proprietária da Barraca Vermelha.
Sônia não é dessa época, quando a cidade era apenas um distrito que ainda há pouco era chamado de arraial. Quando nasceu, lá se iam quase 20 anos da mudança da família para a região, na década de 1930. Nem barraca havia. A produção acontecia em uma casa nos fundos da estação. A mania de criar barraca colorida para vender pé de moleque surgiria anos depois com uma das herdeiras do velho ferroviário, Alcéia Cunha Torino.
Empreendedorismo
Solteira, dona Alcéia decidiu tocar o empreendimento desenvolvido pela mãe. Quando a rodovia surgiu, em meados da década de 1950, ela anteviu ali um grande passo para o pequeno negócio. “Ela lutou muito para conseguir um pedaço de terra às margens da rodovia”, recorda a empresária. “Quando conseguiu, tratou de pintar a barraca de vermelho porque vermelho era a cor preferida dela”, diz, sem nem questionar.
Mas talvez dona Alcéia já previsse naquela época que um ponto vermelho em meio ao matagal que era a então rodovia federal seria o chamariz perfeito para que as vendas alavancassem. Duas décadas mais tarde, ganhava na sobrinha uma aliada. Sônia deixou a profissão de biomédica em São Paulo para se casar e ajudar a única tia.
Pé de moleque modernoSônia não é dessa época, quando a cidade era apenas um distrito que ainda há pouco era chamado de arraial. Quando nasceu, lá se iam quase 20 anos da mudança da família para a região, na década de 1930. Nem barraca havia. A produção acontecia em uma casa nos fundos da estação. A mania de criar barraca colorida para vender pé de moleque surgiria anos depois com uma das herdeiras do velho ferroviário, Alcéia Cunha Torino.
Empreendedorismo
Solteira, dona Alcéia decidiu tocar o empreendimento desenvolvido pela mãe. Quando a rodovia surgiu, em meados da década de 1950, ela anteviu ali um grande passo para o pequeno negócio. “Ela lutou muito para conseguir um pedaço de terra às margens da rodovia”, recorda a empresária. “Quando conseguiu, tratou de pintar a barraca de vermelho porque vermelho era a cor preferida dela”, diz, sem nem questionar.
Mas talvez dona Alcéia já previsse naquela época que um ponto vermelho em meio ao matagal que era a então rodovia federal seria o chamariz perfeito para que as vendas alavancassem. Duas décadas mais tarde, ganhava na sobrinha uma aliada. Sônia deixou a profissão de biomédica em São Paulo para se casar e ajudar a única tia.
Desde 2012, a Barraca Vermelha tem a estrutura de um charmoso café. Ainda às margens da BR-459, é incrível a quantidade de veículos que ali para a todo o momento para comprar a base de sua existência: o famoso doce de amendoim de Piranguinho.
O pé de moleque é embrulhado na hora, praticamente quente. Quase não há espaço para a concorrência: uma das filhas de Sônia abriu uma fábrica para oferecer amendoim temperado e pé de moça, outra pretende desenvolver a versão de paçoca do produto e, no entanto, quem reina no balcão é o pé de moleque.
A empresa, que antes só tinha a dona Alcéia como produtora, hoje conta com a ajuda de 15 funcionários, entre doceiros e balconistas. A produção triplicou em 80 anos e é requisitada até por quem teve que ir embora do país: por email, Sônia já recebeu encomenda até do Iraque.
Aos fundos, a “fábrica”, onde a única máquina presente é o descascador de amendoim torrado. A cozinha ainda adota os padrões da tia empreendedora: bons fogões e braços para misturar amendoim e rapadura, base do legítimo pé de moleque de Piranguinho que tantas histórias ajuda a escrever.
O pescador que só queria ver futebol
Uma dessas histórias é a de José do Carmo Silva, o "seo" Zezinho, como todos o conhecem pelas bandas de Piranguinho. Zezinho era apenas um pescador quando resolveu fazer o seu primeiro pé de moleque. “Fiquei com vontade. Comprei um quilo de rapadura e resolvi fazer em casa”, conta o animado senhor de 60 anos de idade.
A trajetória, contada à exaustão, já ganhou ares de conto. O doce fez sucesso, um amigo sugeriu que tentasse ganhar dinheiro com esse novo hobby, ele descobriu uma maneira de “dobrar” a esposa, a dona Cida, para poder acompanhar uma boa partida de futebol.
“Minha mulher era brava”, relembra "seo" Zezinho. “A turma gritava ‘Zezinho, ‘vamo’ jogar bola!’. A mulher dizia não. E eu, muito autoritário”, diz, fazendo graça com o seu pouco mais de 1,50 m de altura, “escondia no banheiro e gritava ‘vou sim’”. Explicava então para a esposa que precisava vender os doces, já espertamente arrumados em uma cesta. É claro que ela deixava.
Nova geração de empreededores
Ana Paula da Silva Veríssima tinha oito anos quando acompanhava o pai nas suas andanças por São Lourenço (MG) para vender o seu dourado pé de moleque. “Abri a Barraca Amarela em 1974, porque amarelo é a cor dos dourados que eu pescava antes, dos ipês que margeiam as rodovias do Sul de Minas, porque amarelo é ouro”, compara Zezinho, como se pudesse adivinhar muitos anos antes no que daria sua “travessura” para conseguir dias de futebol.
Na década de 1990, foi a vez da filha apostar a sorte na iguaria. Formada em processamento de dados, Ana Paula não encontrou a felicidade na profissão em que se formou. Recém casada, resolveu investir no ramo do pai: trocou um terreno no Distrito de Santa Bárbara, zona rural de Piranguinho, por uma barraca fechada no Centro.
“Então eu comecei a investir, a reformar, a mudar de lugar, colocar mais para a frente, mais para o lado, tentar várias maneiras de chamar público”, conta a hoje empresária de 34 anos.
Com a ajuda do marido, Ana Paula buscou ganhar freguesia. Criou estratégias para atrair revendedores. Pintou a barraca de amarelo, como a do pai. Evoluiu no mercado e, lógico, encontrou obstáculos. “Em 2007, veio a Vigilância Sanitária, exigindo adequações para que pudéssemos continuar no ramo.”
Fama de Piranguinho se consolida
Jarbas Carneiro faz parte desse período. Hoje assessor de comunicação de Piranguinho e um dos organizadores da Festa do Maior Pé de Moleque do Mundo, realizada neste ano de 19 a de 21 de junho, ele acompanhou a consolidação da iguaria como algo típico da cidade. (Confira vídeo ao lado.)
“Na época, a cidade entrou para o Circuito Turístico do Sul de Minas e o prefeito de então viu que havia a possibilidade de atrair visitantes com o doce que já era tradicional”, conta. “Tivemos que investir em cursos de capacitação, com a ajuda do Sebrae, para que o produtor entendesse a necessidade de se adequar às normas sanitárias, revisse a estrutura física do empreendimento e aprendesse técnicas de atendimento. No começo, quase ninguém entendeu, mas, aos poucos, eles viram o quanto esse conhecimento agregava valor à produção”, diz.
Construindo sonho à base de pé de moleque
Ana Paula foi uma dessas pessoas que não desanimaram diante de tantas exigências legais. Com fornecedores dispostos a levar sua marca para todo o país, ela precisava ter uma espaço com capacidade para entrada e saída exclusivas de mercadorias. A futura empresária precisava do antigo terreno do Distrito de Santa Bárbara de volta.
O resultado da recompra é hoje a fábrica que leva o gosto pelo amarelo do "seo" Zezinho para todo o país e, talvez em breve, para o resto do mundo.
“Você imagina que de 11 doces que eu fazia em 1974 você veria uma produção dessas de 60 mil doces por dia?”, pergunta o orgulhoso piranguinhense, que ainda mantém sua própria barraca às margens da BR-459. “Na vida, a gente precisa ter fé e determinação”, garante.
Mas como é feito o famoso doce?
Na terra do pé de moleque quem tem um bom segredo é rei. O velho conselho das avós é seguido à risca. Cada família tem a sua receita. Mas sempre existem aqueles passos básicos que ninguém se incomoda em ensinar. A receita a seguir é a referência do doce feito pela família de Sônia Torino.
Torre 1,5 kg de amendoim em uma forma, espere esfriar e retire toda a casca. Derreta 4 kg de rapadura em uma xícara e meia de água.Deixe o melado ferver um pouco, desligue o fogo e misture o amendoim. Mexa bem até dar consistência e o doce ficar com uma textura homogênea. Coloque em uma assadeira e aguarde alguns minutos para cortar. Atenção
O preparo do doce leva de 10 a 25 minutos. Uma dica para descascar o amendoim torrado é passá-lo por uma peneira. Essa receita é suficiente para um tacho de pé de moleque e rende, em média, 80 pedaços.
Uma dessas histórias é a de José do Carmo Silva, o "seo" Zezinho, como todos o conhecem pelas bandas de Piranguinho. Zezinho era apenas um pescador quando resolveu fazer o seu primeiro pé de moleque. “Fiquei com vontade. Comprei um quilo de rapadura e resolvi fazer em casa”, conta o animado senhor de 60 anos de idade.
A trajetória, contada à exaustão, já ganhou ares de conto. O doce fez sucesso, um amigo sugeriu que tentasse ganhar dinheiro com esse novo hobby, ele descobriu uma maneira de “dobrar” a esposa, a dona Cida, para poder acompanhar uma boa partida de futebol.
“Minha mulher era brava”, relembra "seo" Zezinho. “A turma gritava ‘Zezinho, ‘vamo’ jogar bola!’. A mulher dizia não. E eu, muito autoritário”, diz, fazendo graça com o seu pouco mais de 1,50 m de altura, “escondia no banheiro e gritava ‘vou sim’”. Explicava então para a esposa que precisava vender os doces, já espertamente arrumados em uma cesta. É claro que ela deixava.
Nova geração de empreededores
Ana Paula da Silva Veríssima tinha oito anos quando acompanhava o pai nas suas andanças por São Lourenço (MG) para vender o seu dourado pé de moleque. “Abri a Barraca Amarela em 1974, porque amarelo é a cor dos dourados que eu pescava antes, dos ipês que margeiam as rodovias do Sul de Minas, porque amarelo é ouro”, compara Zezinho, como se pudesse adivinhar muitos anos antes no que daria sua “travessura” para conseguir dias de futebol.
Na década de 1990, foi a vez da filha apostar a sorte na iguaria. Formada em processamento de dados, Ana Paula não encontrou a felicidade na profissão em que se formou. Recém casada, resolveu investir no ramo do pai: trocou um terreno no Distrito de Santa Bárbara, zona rural de Piranguinho, por uma barraca fechada no Centro.
“Então eu comecei a investir, a reformar, a mudar de lugar, colocar mais para a frente, mais para o lado, tentar várias maneiras de chamar público”, conta a hoje empresária de 34 anos.
Com a ajuda do marido, Ana Paula buscou ganhar freguesia. Criou estratégias para atrair revendedores. Pintou a barraca de amarelo, como a do pai. Evoluiu no mercado e, lógico, encontrou obstáculos. “Em 2007, veio a Vigilância Sanitária, exigindo adequações para que pudéssemos continuar no ramo.”

Fama de Piranguinho se consolida
Jarbas Carneiro faz parte desse período. Hoje assessor de comunicação de Piranguinho e um dos organizadores da Festa do Maior Pé de Moleque do Mundo, realizada neste ano de 19 a de 21 de junho, ele acompanhou a consolidação da iguaria como algo típico da cidade. (Confira vídeo ao lado.)
“Na época, a cidade entrou para o Circuito Turístico do Sul de Minas e o prefeito de então viu que havia a possibilidade de atrair visitantes com o doce que já era tradicional”, conta. “Tivemos que investir em cursos de capacitação, com a ajuda do Sebrae, para que o produtor entendesse a necessidade de se adequar às normas sanitárias, revisse a estrutura física do empreendimento e aprendesse técnicas de atendimento. No começo, quase ninguém entendeu, mas, aos poucos, eles viram o quanto esse conhecimento agregava valor à produção”, diz.
Construindo sonho à base de pé de moleque
Ana Paula foi uma dessas pessoas que não desanimaram diante de tantas exigências legais. Com fornecedores dispostos a levar sua marca para todo o país, ela precisava ter uma espaço com capacidade para entrada e saída exclusivas de mercadorias. A futura empresária precisava do antigo terreno do Distrito de Santa Bárbara de volta.
“Não tinha crédito suficiente nos bancos para financiar uma compra dessas”, recorda. “Partimos para a venda mesmo. Começamos a ir para a cidade de Aparecida (SP) e panfletar todos os ônibus de romeiros. Oferecíamos brindes para os motoristas. Assim levantamos o dinheiro”, conta.
Logo o então dono do terreno apareceu interessado em fazer negócio. “Deus é tão bom que, quando conseguimos o dinheiro, o filho do dono do terreno estava prestes a se casar e não queria ficar na roça. Ele veio nos oferecer o imóvel e nós compramos de volta”, comemora Ana Paula.O resultado da recompra é hoje a fábrica que leva o gosto pelo amarelo do "seo" Zezinho para todo o país e, talvez em breve, para o resto do mundo.
“Você imagina que de 11 doces que eu fazia em 1974 você veria uma produção dessas de 60 mil doces por dia?”, pergunta o orgulhoso piranguinhense, que ainda mantém sua própria barraca às margens da BR-459. “Na vida, a gente precisa ter fé e determinação”, garante.
Mas como é feito o famoso doce?
Na terra do pé de moleque quem tem um bom segredo é rei. O velho conselho das avós é seguido à risca. Cada família tem a sua receita. Mas sempre existem aqueles passos básicos que ninguém se incomoda em ensinar. A receita a seguir é a referência do doce feito pela família de Sônia Torino.
Torre 1,5 kg de amendoim em uma forma, espere esfriar e retire toda a casca. Derreta 4 kg de rapadura em uma xícara e meia de água.Deixe o melado ferver um pouco, desligue o fogo e misture o amendoim. Mexa bem até dar consistência e o doce ficar com uma textura homogênea. Coloque em uma assadeira e aguarde alguns minutos para cortar. Atenção
O preparo do doce leva de 10 a 25 minutos. Uma dica para descascar o amendoim torrado é passá-lo por uma peneira. Essa receita é suficiente para um tacho de pé de moleque e rende, em média, 80 pedaços.
Do G1 sul de Minas









