Químico nuclear faz sucesso produzindo geleias no Sul de Minas

Ele já foi representante na ONU e morou na Áustria, mas encontrou na técnica de conservação de frutas uma nova vocação.




Há cerca de 10 anos, a vida de Edmundo Garcia Agudo está entre os tachos de geleia do sítio no Distrito de Monte Verde (MG). Com touquinha e avental brancos, ele em nada remete ao químico nuclear que já compôs a equipe diplomática da Organização das Nações Unidas (ONU), como representante do Brasil na Áustria. Aos 76 anos, ele guarda o domínio das fórmulas para tirar o máximo de sabor das frutas locais e colocar em simpáticos vidros. "A aposentadoria permite viver, mas não permite as gordurinhas. Então as gordurinhas são feitas com a geleia", ri.


Da média inicial de 300 potes por mês, a produção do "seo" Edmundo passou para em torno de 3 mil. Na loja de artesanato que mantém com a esposa, a mestre em toxicologia Isa Ramos de Queiroz, 90% do faturamento corresponde aos doces. No começo dos anos 2000, as vendas não passavam de 30%.





"Houve também uma mudança no perfil do consumidor. Entre levar uma caixa de R$ 120 e uma geleia gostosa de R$ 22, o pessoal opta pelo mais barato", observa o químico, que logo reconhece, com orgulho, que, talvez, também tenha conquistado o paladar de muitos visitantes que passam pelo distrito.






Menos é mais


Os 15 sabores produzidos na pequena fábrica, construída em uma área cercada por araucárias, levam, em sua maioria, ingredientes da região. Jabuticaba, morango, framboesa, fisális, a pimenta. O que Edmundo e Isa não cultivam, compram de produtores vizinhos. Ajudam a economia da região onde vivem e garantem a qualidade da matéria-prima que tanto apreciam.


Na geleia, até a casca da fruta é aproveitada. "Seo" Edmundo acompanha cada etapa do processo. Tem duas ajudantes, mas o açúcar e qualquer outro produto usado para padronização dos seus doces apenas ele controla. Faz questão. A maior preocupação é que suas geleias não só tenham pedaços de morango, por exemplo, mas que, ao degustar, o cliente sinta como se estivesse provando a própria fruta, em sua melhor forma, sem qualquer dulçor extra.


"Eu nunca gostei muito de açúcar. Meu café é seco, curto e sem açúcar nem adoçante", conta. "Mas quando morei em Viena [Áustria], tinha um quintal com pomar e a vizinha pediu framboesa para fazer geleia. Ela me trouxe um pouquinho do que ela fez e eu agradeci muito, não quis abrir na frente dela, porque, né? Depois, resolvi experimentar. Quando eu pus aquilo na boca, eu, que sempre gostei de comer coisa boa, fiquei impressionado, porque nunca tinha comido uma geleia com tão pouco açúcar e um gosto tão intenso de fruta como aquela. Por que no Brasil não se faz assim?"


Vocação de doceiro


Foi a partir da troca de gentilezas de vizinhança que o morador de Monte Verde aprendeu qual ciência havia por trás desses doces, desenvolvidos há séculos como uma técnica de preservação de alimentos. Ao voltar para o Brasil, começou a fazer em casa para a família e em pouco tempo o hobby virou um investimento. O viajado químico e professor, espanhol de Barcelona na origem, que imigrou ainda criança para Buenos Aires (Argentina) e, nos anos 1970, "descobriu-se" e naturalizou-se brasileiro, passou da rejeição ao açúcar a um empreendedor do ramo das geleias.


"Se a receita pede 5 Kg de açúcar, eu coloco 4,5 Kg. 'Macaco velho' que sou, sei que é mais fácil colocar açúcar do que tirar. Na hora que você faz com as mãos, com a boca e entendendo os processos, com a química que acontece nos tachos...", diz, saboreando nas palavras não ditas, o segredo das receitas que têm feito sucesso em várias partes do país e até já resultaram em encomendas feitas do exterior.


"Segredo eu não revelo, mas eu dou uma dica para fazer uma boa geleia: experimente, teste, tenha paciência. Coloque sempre menos açúcar do que a receita pede e vá acertando aos poucos."

Fonte: G1 Sul de Minas